segunda-feira, setembro 29

Danoninho Revolutions - Parte I

O cartaz anunciava uma festa no próximo fim de semana. Festa rural, coisa de interior. Além das vaquejadas, ainda haveria um concurso. De quê, não importa. O mais importante eram os prêmios. Para o primeiro lugar, um motor. Um MOTOR! O vice-campeão levaria para casa um gerador. Para os momentos de escuridão, luz. Para os momentos de solidão, TV. Ou choque, já que conceito de diversão é subjetivo. E para o terceiro lugar, um barco, cara. O ouro e o bronze podiam combinar uma sociedade. Ganha-se um prêmio, e também um cumpádi para a pescaria nos fins de semana. Enquanto o riso ainda estava na minha cara, ouço um grito:

- É TU, CHEFÃO!

Dedo em riste, ele apontava para a balsa que se aproximava. O senhor tinha as barbas brancas já, mas seus cabelos estavam pintados de loiro. Em sua mão, um copo de extrato de tomate, com líquido até a metade. E quando ele passou do meu lado, inspirei para confirmar, e logo o cheiro doce e estridente de cachaça me fez ver algumas estrelas. Olhei para o rio a minha frente... o Rio Araguaia. Eu cambaleava levemente, não sei se do calor ou do destilado. Há alguns dias atrás, estava exatamente na mesma posição, do outro lado do rio.


***


Depois que o carro estacionou na balsa, descemos do carro para acompanhar a sua travessia até Tocantins. Meninos brincavam na margem, e duas meninas se refrescavam de roupa na parte rasa. Aparentavam seus treze ou quatorze anos. Eram prostitutas. Meu interlocutor me falava que os policiais da região eram os primeiros a usufruir de seus serviços. “Esta é uma terra sem lei”, me dizia:

- Ra-pái, se andar de moto usando capacete, é capaz de você ser preso!

Ri inadequadamente. Os relatos eram diversos: sobre empresários, sobre políticos, sobre o povo, seus pequenos delitos. Esta era a minha cerimônia de recepção (sem contar o almoço de gala, lógico).

Do lado esquerdo, para onde o rio corria, uma serra compunha a paisagem de forma correta. Há cinqüenta anos, esta serra foi o cenário para a famosa Guerrilha do Araguaia. Os comunistas se escondiam na Serra das Andorinhas quando os militares os caçavam. Sangue, muito sangue...

Nos dias que se seguiram, fiquei mergulhado nesta paisagem histórica, no mínimo. Mas mergulhei no rio também. Fiquei receoso no início, devo confessar, mas não podia perder esta oportunidade. Não podia mais ignorar o fato do Rio Araguaia estar passando na frente da pousada onde estava hospedado. Algumas donas passavam o dia inteiro nas margens do rio lavando roupa, com o sol na cabeça (não é uma Brastemp, mas...), e meninos e meninas pulavam na água para tentar lavar o calor do corpo. Resolvi fazer o mesmo.

Ignorei sacos e garrafas de plástico na margem, e entrei vagarosamente na água morna. Para mim, aquilo valia o mesmo, ou até mais do que um carimbo no passaporte. Era uma viagem para o passado, toda aquela rusticidade. Tomei cuidado com os diversos seres que falavam ter na água, mas que felizmente não apareceram, e o tempo foi passando até que o rio engoliu o dia. Saí da água cansado, cheguei ao meu quarto e tombei. Adormeci com cheiro de Araguaia na pele.

Um comentário:

Luciana Yeung disse...

Eu ouvi no Animal Planet dizer que nestes rios da Amazônia tem uns peixes que entram no calção dos homens e depois... vão pra parte traseira, se é que você me entende... Cuidado, hein!