terça-feira, novembro 11

C

Do shopping center até o meu primeiro destino dava mais ou menos uns dois quilômetros, sendo otimista. O horário estava contado, mas já havia feito isso diversas vezes. Com o passo um pouco mais acelerado, chegaria a tempo sem problema algum. E assim decidi fazer. Tanto tempo sem fazer exercício, né? Seria uma boa oportunidade para acelerar um pouco a circulação.

Ipod no ouvido, o trance a 135 bpm ditava o ritmo dos meus passos. Tum, tum, tum tum... Postura ereta, ombro para trás, presta atenção no movimento dos braços, e o meu tempo foi ótimo! Corpo quente, coração acelerado e o suor começava a brotar da testa. Pausa para o primeiro compromisso, e quase conseguia sentir a endorfina correr pela veia. Meia hora depois, já sentia o corpo um pouco mais frio, mas tinha mais dois compromissos pela frente. Quer saber? Já cheguei até aqui mesmo, vamos seguir a diante... Sem gasolina, sem diesel, sem álcool.

Alguns minutos mais no ambiente refrigerado, e seguia para o meu encontro. Ela queria almoçar na Savassi, e num calor de quase quarenta graus, nos rendemos ao coletivo. Mais uma horinha sentado, conversa vai, comida indiana vem, e a satisfação é geral. Como ela estava com pressa para voltar ao trabalho, opta por um taxi. Por que eu não escolheria fechar a hipotenusa? Tentei, mas algo estava errado comigo.

Tibial anterior e extensor longo do Hálux se encontravam paralisados. Era como se tivesse injetado ácido sulfúrico na área subcutânea. A essa altura, os poucos passos que arriscava me saíram como C-3PO. Eu estava plantado no meio da calçada, as pessoas passavam por mim distraídas pelos seus afazeres vespertinos, não faziam idéia do meu sofrimento. E a verdade me veio como um roundhouse kick no queixo: eu não sei andar.

Congelado no fervilhão urbano, tentei refletir sobre a minha existência, e o quê tinha feito ou deixado de fazer para merecer aquilo. E só consegui chegar a uma conclusão: tinha finalmente chegado à idade do “C”. Sedentário, senil, sentado, serestas (trance uma pinóia!) e cereais, porque nem o intestino funciona direito. O natal chegando, e eu ainda tinha que gastar dinheiro com uma cadeira de rodas para mim. Talvez aproveitasse a oportunidade para comprar um cobertor quadriculado e um gato para ficarem no meu colo, enquanto observo a rua da janela da minha casa fria com cheiro esquisito.

Enquanto me arrastava em direção à primeira alma caridosa que pararia para me acudir, tentava não mais pensar no futuro que me aguardava. Entrei no taxi gemendo dores, e balbuciei alguma coisa próxima do local onde estava meu carro. Meu olhar estava parado no pára-sol. “Que calor, né?”, e eu “Mmm...”. Será que quem tem Unimed paga menos em aparelhos ortopédicos? Eu acho que o cobertor pode ser aqueles que tem em ônibus Cometa, meio cinza com traços azul e vermelho, parece que está em desconto no Varejão das Fábricas... Dou uma passada lá amanhã (de carro). Pensando bem, eu acho que o cheiro esquisito da casa de pessoas idosas vem dessas coisas. Será que a Trousseau tem cobertores quadriculados? Vou ter que parcelar... “São oito e setenta”.

“A corrida deu oito e setenta”, ele repetiu. Perguntei se poderia pagar tudo em moeda, porque a moça da Caixa tinha me pagado os quebrados tudo em pratinhas. Supimpa.