quarta-feira, setembro 3

Conto de Fadas

Mesmo que tardiamente, queria confessar que fiquei extremamente emocionado. Assistir à abertura dos jogos olímpicos envocou em mim um sentimento de importância, orgulho, pois por mais que eu tenha nascido e crescido nestas terras tupiniquins (seus risonhos lindos campos têm mais flores...), o molhinho agridoce ainda corre nas minhas veias. E a forma como foi mostrada ao mundo que a cultura chinesa é algo bonito, e não somente exótico, me alegrou fazer parte de algo tão grandioso. Como não podia deixar de ser, logicamente surgiram as controvérsias... Mas eu aposto com qualquer um de vocês que, se tivessem colocado a outra menininha que realmente cantou no lugar daquela que dublou, os comentários iam ser: "Gente! Ela canta tão bem!... mas é tão feinha, né, tadinha!....". Ou senão: "Mas com 1,3 bilhões de habitantes, não podiam escolher uma mais bunitinha não?"... Pois é... Nós, seres humanos, somos assim. O que importa é que foi um show extraordinário, e excedeu as expectativas de todos no cumprimento do seu papel: de ser algo simplesmente maravilhoso. E daí se dublou? E daí se teve computação gráfica?... O negócio não é para ser bonito? Então pronto! Hollywood está aí para não me deixar mentir...

Mais bonito ainda foram os dias que se sucederam à cerimônia. Assistir pessoas (exatamente como nós) buscando a superação de seus limites é, no mínimo, inspirador. Pensar que os poucos segundos que vivemos junto aos atletas são o reflexo de anos e anos de dedicação, abdicação, concentração, transpiração, enfim, ação, me faz lembrar de algo que me aconteceu (que dividirei em breve). E vê-los todos naquela Torre de Babel, convivendo em harmonia, até mesmo em seus "campos de batalha", me leva ao conceito mais primitivo dos jogos olímpicos, que é da competição pacífica, onde todos estão ali para mostrar o que têm de melhor... e sem morrer ninguém. Muito respeito que tenho por eles (menos pelo cubano chapado, que deu um pau no juiz porque perdeu... ele, pode arder nas chamas dos inferno!).

Só neste ano, já me falaram (não apenas uma vez) que contos de fadas não existem. Peraí!... Primeiro o Papai Noel... depois Spectroman... agora conto de fadas também?? Que estória é essa?!... As pessoas estão chegando em um nível de desilusão com a vida que está beirando o intolerável. E esta parte eu estou falando sério. Político roubar dinheiro da gente é normal. Filho drogado matar a mãe é normal. Policia e bandido ser a mesma coisa também é normal. Aí quando eu quero acreditar em alguma coisa boa, não pode, porque conto de fadas não existe... qual que é? Para mim, isso tem outro nome, e é comodismo. Mesmo porque em momento algum, nem eu, nem essas outras pessoinhas que escrevem (um tal de mano Grimm aí) falamos que ia ser fácil. Pára pra pensar: Rapunzel vivia num cárcere domiciliar; Branca de Neve, além de ter que dormir em camas juntadas (a coluna não agradece), sofre de uma intoxicação alimentar; a Bela Adormecida está em coma (!); e a Chapéuzinho, tadinha, é vítima de trabalho infantil em serviços de delivery, vive em ambiente hostil (selva com lobos É hostil) e tem a vó debilitada. E a gente reclamando de nossas vidas... A mulher está em coma, véi!

Comodismo, porque acreditar, e ir em busca de um sonho, de um final feliz, dá um puta trabalho. Temos que sair da inércia. São valores contra, são pessoas contra, e em uma existência conceitual, o status quo já é contra. Mas junta isso tudo, e ainda vai ser fácil, se compararmos com o maior dos inimigos, e esse é você mesmo. Sempre estamos nos minando, inventando obstáculos que existem só dentro da gente. E neste processo de auto-engano, deixamos de viver um conto de fadas, porque convencemos as outras pessoas que eles (os contos) não existem, e essas pessoas nos ajudam a acreditar nisso confirmando a nossa estória.

E se realmente todas as pessoas acreditassem nisso, quem ia ficar com as medalhas de ouro? Não existe final feliz, não é assim? Aliás, existe sim, mas é um acidente de percurso... Se é assim, o quê nos nutre para continuar sendo? O salário? O amanhã? Vai falar isso pro Phelps então... "Meu querido, cai aí na piscina e vai nadando. Não pára não, hein?". E a nossa vida vai ser ficar nadando até a gente não conseguir mais. Por que não acreditar na medalha de ouro? Por que não acreditar no recorde mundial? E no olímpico? Por que não acreditar no trabalho dos sonhos? Por que não acreditar na princesa, ou no príncipe? É difícil, não é? Conquistar isso tudo. Pessoas podem viver a vida inteira infeliz buscando isso, eu sei. E é por isso que falam que contos de fadas não existem. O que vier é lucro. Mas infelicidade maior não seria sequer ter tentado? Eu acho. É muito mais legal mostrar os ferimentos das lutas contra os dragões, ogros e bruxas da
vida do que viver a vida insossa.

É só acreditar. E tentar. Mas não vai ser fácil.

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